terça-feira, 11 de setembro de 2007

O Final Acachapante – parte II

Ou Agora é o Fim Mesmo

- Desde o princípio, a solução desse caso foi complicada por dois fatores preponderantes. Primeiramente, o tempo. Meu primo, assim como a maioria de vocês, tinha motivos para temer uma investigação policial adequada. Um belo grupo de patifes se reuniu aqui esta noite: empresários, jogadores de pôquer, delinqüentes juvenis... Todos com motivos de sobra para liquidar o velho. Exatamente o segundo fator complicante: o excesso de suspeitos.

- Mas, detetive Mesquita, onde o senhor aprendeu a falar assim?!...

- Por favor, agora não. Vejam bem, nós, detetives, usamos muitas vezes de um critério básico da lógica para chegar ao fundo de um mistério: eliminadas todas as impossibilidades, a solução que se apresenta, por mais inverossímil que pareça, é a verdade.

- Larga de ser burro, Neneco. Inverossímil é... opa. Nada não.

- E aí? Vou poder desvendar o crime em grande estilo ou vocês vão ficar me interrompendo?

- Mal aê. Prossiga, por favor.

- Pois bem, nesse caso muitas soluções pareciam perfeitamente possíveis. Todos pareciam ter tido a oportunidade adequada para cometer o crime. Mais ainda, muitos pareciam se orgulhar de terem chegado perto de matá-lo. Voltemos um instante ao problema da falta de tempo. Como resolver o caso antes de se fazer uma autópsia no cadáver? Como prescindir dos delicados procedimentos de revista do local do crime em busca de pistas? Eu teria que achar o assassino em poucas horas, usando para isso apenas minha capacidade dedutiva. A enormidade da tarefa que se me apresentava a princípio me assustou.

- Bem se vê...

- Os depoimentos, além de me darem uma visão mais clara de quem era o velho e seus supostos amigos, abriram na minha mente privilegiada novos caminhos para a solução da charada. Quem teria a força de matar um homem com apenas uma punhalada? Uma mulher seria capaz? Mas quem tinha certeza de que o velho teria morrido mesmo da punhalada? Porque, mesmo sem saber do truque, estranhei que alguém com uma faca nas costas resolvesse fazer um tour pela lavanderia. E a baba? Ninguém mencionava a baba do velho, mas ele havia sido visto claramente babando!

Foi só a leitura do diário, porém, que ao mesmo tempo jogou de volta às trevas e trouxe a luz para a resolução do caso. Porque Austregésilo revelou que sabia que todos queriam matá-lo. Mais do que isso, estava preparado e desejoso de uma tentativa de assassinato. Então por que todos os dispositivos de segurança falharam? Se o velho estava prevenido de seu algoz, como ainda assim ele conseguiu driblar sua vigilância? Foi então que eliminei todas as impossibilidades e o que restou foi a vida. A vida, com suas incongruências e incertezas; o imponderável e o destino.

- Er... dá licença? Posso per-gun-tar uma coi-si-nha?

- Pois não, Danton.

- Dá para ser mais cla-ro?

- Dá, sim. Eu queria mostrar para vocês uma travessa que encontrei na copa da mansão. Reparem que é um arranjo de frutas de cera. Mas as frutas são esculpidas à perfeição. Grande fanfarrão que era, Austregésilo provavelmente se deleitava com as confusões dos recém-contratados empregados, que comiam secretamente suas frutas por engano, só para perceberem que eram de mentira.

- Como você reparou nisso, grande?

- Quando cheguei, tive a maior vontade de pegar uma dessas uvas. Estavam mesmo muito vistosas. E o que me intrigou desde que vi o cacho foi a falta de uma uva no arranjo. Sem que ninguém notasse, procurei, ao longo da noite, a uva perdida...

- E o que um cacho de uvas de cera faltando uma teria a ver com a morte do velho mesmo?...

- Cale-se, cretino. Você está estragando meu mise-en-scene.

- Se ao menos eu soubesse o que é misancêne...

- O fato é que encontrei a uva quando terminei a leitura do diário.

- Ugh, você está enfiando a mão na garg...

- Ela está aqui! Austregésilo morreu engasgado com uma uva de cera.

- Ooooooooooooooooooooooohhhhhhhhh!

- Vitimado por sua própria fanfarronice combinada a uma larica mal-sucedida, provavelmente causada pela sessão de fumaça que partilhou com Ronald. Engasgado, ainda tentou buscar ajuda de alguém. Foi quando topou com Gabriel na lavanderia, a quem Austregésilo, morrendo engasgado, pareceu apenas um “velho arrogante com uma faca enfiada nas costas” – faca essa que já havia sido enfiada pelos ingênuos irmãos Grosso, numa trama do velho. Ele sabia que era mal-quisto e, dando as condições adequadas, era impossível que, de todos os convidados, escolhidos a dedo entre antigos desafetos ou gente que tinha contas a acertar com ele, nenhum tentasse matá-lo.

- Bem que a gente estranhou aquela mira nas costas dele, dizendo “enfie a faca aqui”.

* * * * * *


“Aqui jaz Austregésilo Castello-Branco, que morreu engasgado com uma uva de cera”.

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Interlúdio 17

- Cabelo! Você checou se o velho estava morto mesmo?
- Porra, Neneco, o detetive é você! Eu sou o mordomo!
- Pensei que verificar o pulso dos cadáveres estava nas suas funções. Junto a servir chá, apanhar o casaco dos convidados e ser culpado de tudo.
- Que tal pararmos de gracinha e irmos lá checar o corpo?
- Vai na frente que eu já tô indo atrás.

(...)

- E aí?
- Tá morto mesmo. Mas a faca, veja só, estava acoplada nessa geringonça de dublê amarrada aqui nas costas. Não tem sangue nem nada da facada.
- E como você tem certeza de que ele está morto?
- Bom, não consigo achar o pulso.
- Bota um espelhinho na frente da boca dele. Sempre vejo isso nos filmes.
- Ok.
- Cabelo, porque você tem um estojinho de pó compacto no bolso?!
- Eu... er... Ah, é o único espelhinho que eu tenho aqui, não reclama. E não faz perguntas.
- E aí, embaçou?
- Nada.
- Ouve o coração.
- Bom, isso era capaz do velho não ter nem em vida...
- Tentou fazer cosquinha na barriga?
- Que tipo de procedimento é esse, Neneco?
- Pô, ninguém resiste a cosquinha na barriga!
- Eu não vou fazer cosquinha na barriga de um cadáver.
- Tá bem, eu me encarrego dessa... A-cuti-cuti-cuti! A-cuti-cuti-cuti!
- Nem se mexeu.
- Então tá morto mesmo. Mas eu acho que já sei o que aconteceu. Reúna os convidados na sala, Cabelo. E me ajuda a levar o corpo para lá.

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

O Final Acachapante - parte I

Ou O Diário do Velho, Só o Último Mês

25/05
Hoje colhi uma bela flor no jardim.
Fui de novo visitar o que, no futuro, pretendo transformar na Igreja de Jesus Cristo dos Frotas dos Últimos Dias. O problema é que eu acho que eu vi a Margarida rondando por lá. Não sei se ela me viu. Ela achava que eu não sabia que ela não podia ter filhos quando mandei ela sair com o Igor, mas eu sabia. Eu sempre sei de tudo, eu sou sabão (hihihi).
Ela não perde por esperar. Atriz e modelo, sei...

03/06
Hoje bati com o dedinho no pé da poltrona e falei um monte de palavrão.
Já contei que chamei um biografo para escrever um livro sobre a minha vida. Era pra ser um livro tipo o daquele cara da GM, contando minha trajetória de sucesso no mundo empresarial, mas o idiota descobriu meu lance com o Roberto e quer colocar no livro. Tentei argumentar calmamente com ele que eu estava pagando, então eu dizia o que podia ou não escrever, mas ele continuou teimando, mesmo o Cabelo enfiando a cabeça dele repetidas vezes na banheira cheia de água. Depois vou ter que dar um jeito nele.

07/06
Hoje o cheiro do café espalhado na cozinha me trouxe uma série de lembranças.
Lembrar de pagar o carnê do bagulho.
Lembrar de dar um jeito de tirar o manqueta do meu testamento.

12/06
Hoje comi a Carminha a noite inteira.
De manhã veio aqui aquele meu sobrinho doido. Agora ele veio com um papo de arrastar móveis de um lado para o outro pra mudar as “energias”. Ele acha que vai ficar com toda minha grana... Vai pensando. De qualquer jeito acho que ele está de namorico com o Cabelo. Esse mundo tá mesmo perdido.

14/06
Hoje vi uma nuvem no céu que parecia um coelho.
Cara, se tem uma coisa que me tira do sério são derivados de polipropileno. Ainda se fosse funcionalizado com anidrido maléico, vá lá. Mas não vejo razão para a existência do polipropileno puro e simples, assim. Afinal, quem precisa de plástico? Eu sou do tempo em que tudo era embalado com folha de bananeira, e vivíamos bem assim.

20/06
Hoje comecei a planejar meu assassinato.
Já faz tempo ando meio entediado com essa vidinha. Nos bons tempos a gente aprontava bastante, agora é só esse arroz feijão de chantagem, agiotagem e jogatina; tudo muito boring. Claro que eu não vou morrer de verdade. É só pra causar mesmo.
Vou fazer uma festa e chamar um monte de gente que tem motivos pra me matar. Aí eu supostamente apareço morto no meio da festa, depois dou um jeito de sumir e vai ser o maior fuzuê, com neguinho se acusando e o escambau. Os jornais vão fazer a festa, muito da hora. Aí, sei lá, um mês depois eu apareço vivinho, tipo último capítulo de novela. Acho que vou chamar o Rino na festa, ele é o único que vai entender o que tá rolando e vai se divertir. Só tenho que lembrar de não convidar aquele cara da piada do pavê, não quero concorrência, alguém pode acabar se empolgando e matando ele de verdade.
Andei conversando com uns dublês e especulando uns esquemas. Tem a famosa facada nas costas; parece que eles têm um dispositivo para isso. Aí dou um jeito de algum dos idiotas ter a faca ao alcance das mãos e ofereço minhas costas já usando o aparato hollywoodiano.
Mandei também fazerem meu caixão. Acho clássica essa, de encomendar o caixão. Vai chegar na hora da festa, pra dar um clima.
Enfim, cuidados todos os detalhes, vou me divertir à pampa. (Eu me lembro de quando usar gírias de velhinho levantava meu astral; agora, nem isso, bro). Preciso urgente de alguma adrenalina. E a única cena que me resta é a morte.

O Diário do Velho

"Querido diário,
Hoje eu briguei com o Rino na hora do lanche. Eu peguei o último biscoito recheado do pacote e ele arrancou da minha mão, aí eu dei um tapa na cara dele e ele chutou minha canela. Aí o biscoito caiu no chão e o gordo do Zeca pisou e esmigalhou tudo. Aí eu e o Rino começamos a cantar: Timtumtum elefante, Timtumtum elefante! A gente chama o Zeca gordo de timtumtum porque quando ele anda a terra treme: Tim-tum-tum, tum-tum-tum. Hahahahahaha, que engraçado!
Mas o chato mesmo é que aí veio a tia Lúcia e deu bronca na gente e perguntou se a gente tava feliz agora que ninguém ia comer o biscoito porque ele tava todo esmigalhado. Claro que a gente não estava feliz, a gente queria mesmo que tivesse mais um pacote de biscoito.
O resto do dia foi chato. A gente ia jogar bola e escolhemos os times e tudo, mas aí vieram os grandes da quarta e expulsaram a gente da quadra. Depois teve duas aulas seguidas de português e a gente teve que copiar um texto enorme. Depois eu fui pra casa e depois fui brincar na rua e depois voltei pra casa e depois tomei banho e depois jantei e agora estou escrevendo aqui.
Boa noite."



- Neneco, de que data é isso?
- 17 de março de 1936.
- Neneco!
- Que foi, Cabelo? A gente tem que começar a ler um livro pelo começo!
- Não me irrita, Neneco. Vai logo pro final. Começa aí pelo último mês de vida do velho. Se não tiver nada a gente vai mais pra trás.
- Tá bom, mas eu fiquei com pena do Zeca Gordo.

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Interlúdio 16

- Então foi você que apunhalou o velho pelas costas! Ou foi você? Ou foram vocês? Agora fiquei meio confuso. Cabelo, algema eles!
- Eles já tão grudados um no outro, Neneco. Não acho que algemar eles vá fazer muita diferença.
- Hum, tem razão. Então vamos chamar logo a polícia. Mais um caso resolvido com sucesso.
- Eu não chamaria o fato do assassino aparecer de livre e espontânea vontade confessando o crime de “mais um caso resolvido com sucesso”. Mas pelo menos livraram minha cara. Deixa eu apanhar o telefone...


- Um momento, detetives!
- Desculpe, os depoimentos acabaram e nós já temos um culpado. Aliás, um não. Dois. Estamos bem satisfeitos.
- Mas eu encontrei um negócio que pode interessar. É um livro grosso, de capa dura, com colagens na capa e anotações diárias de seu proprietário, sob um ponto de vista subjetivo.
- Você quer dizer... um diário?
- Isso mesmo.
- Onde você achou isso, rapaz?
- Naquele cômodo da casa destinado ao processo de limpeza das roupas domésticas.
- Na lavanderia?
- Isso aí. Vocês me botaram lá para autografar meu livro, lembra?
- Ah, é. E aí, Cabelo, vamos dar uma olhada nessa bagaça?
- Claro que vamos, Neneco! Que tipo de detetive é você, que despreza uma evidência importante dessas, o diário da vítima?
- É que está quase amanhecendo, estou com fome e isto está me cheirando a reviravolta...

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Irmãos Grosso

Lacerad: Boa noite. Nós somos os irmãos Grosso. Eu sou Lacerad Grosso.

Dan: E eu sou Dan Grosso. Sim, é um nome patético, eu sei. Mas acredite, nunca fizeram piada com esse nome na escola. Acho que o fato de ter um irmão gêmeo grudado em mim pela nádega esquerda sempre foi uma fonte mais interessante de piadas.

Lacerad: Nossa condição biológica é delicada.

Dan: Na verdade ela é delicada somente no sentido figurado. Fisicamente, nós estamos bem presos.

Lacerad: Pessoas siamesas, pra quem não sabe, não são como gatos de corpo branco e cabeça preta. Pessoas siamesas são grudadas. Todo dia. Até que a sorte os separe.

Dan: Sorte que nunca veio.

Lacerad: Da defecação até a procrastinação. Da urinagem até a modelagem. Na infância é péssimo, não dá pra brincar de pega-pega. Mas depois piora...

Dan: Eu nunca gostei de brincar de esconde-esconde. Todo mundo encontrava a gente. Eu até conseguia me esconder no armário, mas o Lacerad sempre ficava de fora. Aliás, falando em armário...

Lacerad: ...piora quando você descobre suas preferências sexuais alternativas. Ok, isso não cabe na discussão de hoje.

Dan: Afinal, vocês não estão aqui para saber sobre a nossa triste infância. Você querem saber quem usou aquele velho filha da puta como porta facas, não é mesmo? Espero que na autópsia descubram que a meia vivarina que ele usava não foi capaz de protegê-lo da faca Ginsu. Mas para isso, precisamos falar mais um pouco da nossa condição física.

Lacerad: Na verdade, gostaríamos de reclamar daquele filme naipe sessão da tarde, dos gêmeos siameses. Aquilo é uma banalização piro-sincrética dos valores folclóricos indígenas. Ou como dizia Kincaid Spencer, uma puta falta de respeito. Aliás, nem assistimos essa merda. Aliás nem vamos ao cinema porque sempre rola a piada da meia-entrada com a gente. Como dizia Kincaid Spencer, uma puta falta de respeito.

Dan: Apesar das diferentes preferências sexuais, que meu irmão prefere chamar de "preferências orificiais", nós sempre trabalhamos bem em equipe. Primeiro tentamos fazer dupla de badminton, depois de tênis de mesa (a gente não chama de ping pong pois achamos um nome, digamos, pouco olímpico). As duas tentativas fracassaram. Especialmente a do tênis de mesa. Disputamos um campeonato com dois chineses siameses com polidactilia. Eles jogavam mais rápido do que o Forrest Gump depois de usar crack.

Lacerad: Também jogamos pebolim humano (sim, isso existe) e não nos saímos mal (atuávamos na zaga, desempenho até melhor do que a saudosa dupla Gralak & Elias). Até que um dia realizamos (realizamos não, percebemos. Realizar é verbo de candidata à miss) que a nossa verdadeira vocação estava na mordomia. Não aquela banda de bichonas espanholas de cabelos esvoaçados por leques de purpurina. Falo da profissão mais inglesa do Peloponeso Setentrional: a arte de ser mordomo. Mas não a de mordomos solitários como Sérgio Mamberti, o eterno criado da Odette Roitmann, ou Alfred, o solicitíssimo puxa-saco de Bruce Wayne. Apostamos num novo conceito, do mordomo de quatro braços. O conceito do um lava e o outro enxuga. Um abre a porta e o outro pega o casaco. Um faz apologia e o outro dichava. E nos matriculamos no curso de mordomos do Sesc.

Dan: Nós tínhamos essa idéia de sermos um novo conceito em mordomos e a abraçamos com os quatro braços. Estávamos realmente muito empolgados. Mas o que o meu irmão Lacerad não esperava era que, mais uma vez, nós iríamos nos tornar motivo de piada. E não eram piadas sobre o sobre o fato de nós termos a mesma maldição dos irmão Corso (tente imaginar como é desagradável sentir tudo o que o seu irmão sente, especialmente quando ele é um gay extremamente ativo e você é um heterossexual convicto). O problema era que, apesar de nós sermos os primeiros da turma, nós nunca havíamos sido culpados de nada. Dan e Lacerad, os mordomos inocentes, eram como eles nos chamavam.

Lacerad: Muita humilhação, cara, sem idéia....

Dan: Não foi fácil. Desistimos do curso, deixamos nosso sonho para depois. Tentamos comprar uma carteira falsa da Ordem dos Mordomos do Brasil, mas só conseguimos uma carteirinha da OAB. Foi quando o meu irmão teve uma idéia genial: E se nós matássemos alguém? Alguém rico e que more em uma mansão? Isso nos daria o respeito que tanto precisávamos. Só assim poderíamos voltar de cabeça erguida para o nosso curso de mordomos no Sesc Itaquera.

Lacerad: Foi aí que começamos a prospectar potenciais alvos. E foi nessa que abriu uma vaga para mordomos estagiários na casa do ilustríssimo Sr. Austregésilo Castello Branco. Tínhamos certeza que as tendências bizarras do ancião não resistiriam ao nosso freak show gratuito e cotidiano. Dito e feito, fomos contratados. E então se seguiram dois felizes anos nos quais tentávamos diária e sistematicamente matar o maguína (sic), sem resultados convincentes. Cianureto no café, alçapões artesanais embaixo de tapetes, superaquecimento da sauna, freio do carro sabotado. Nada funcionava.

Dan: Até que o velho se encheu e mandou a gente embora.

Lacerad: Mas o tempo passou e o bom Austré mostrou que não guarda rancor. Ficamos muito honrados de termos recebido o convite para esta festa e com isto a última e imperdível oportunidade de matá-lo.

Dan: E foi exatamente isso que a gente fez.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Interlúdio 15

- Neneco, cê ta de sacanagem comigo. Fala a verdade, você contratou esse cara para falar que é o tal do tio Vladimilson.
- Deixa de ser paranóico, Cabelo. Eu estou aqui a noite inteira com você. Como ia contratar alguém para alguma coisa?
- Sei.
- Mas você tem razão. Esse cara não parece muito o tio Vladimilson não. Isso deve ser coisa do Adamastor. Esse sim é um piadista incurável.
- Que Adamastor?
- Como que Adamastor, Cabelo. Como você é esquecido! O primo Adamastor, filho do tio Vladimilson!
- Desisto! Você pega esse bando de parentes imaginários e enfia...
- Calma, Cabelo, não precisa ficar nervoso. E aí? Acabou a parte dos interrogatórios? Já podemos ir pra casa?
- Que casa, Neneco? A gente ainda precisa descobrir quem matou o velho. Se não eu que vou acabar me ferrando. Vou lá fora ver se a gente já entrevistou todo mundo.
- Tá.
(...)
- Er... Neneco, tem uns caras aí fora dizendo que querem falar com a gente.
- Uns caras?
- É, hum, parece que são dois irmãos, mas depende um pouco do ponto de vista. Eles estavam até agora escondidos na despensa, por isso ninguém notou.
- Cabelo, não estou entendendo nada, manda logo um dos caras entrar.
- Hum, acho melhor falar com os dois ao mesmo tempo.
- Tá bom, entra os dois logo então!