Gabriel Von Doscht
Quando criança Austregésilo tinha os melhores brinquedos, as melhores roupas, os melhores troféus. A inveja que Austregésilo despertava em todos os outros meninos era tão grande que ele teve de ir embora do nosso bairro. Eu nunca mais o vi desde então, por isso, essa festa era muito importante para mim.
Ao chegar na festa fui recepcionado pelo mordomo, ao qual perguntei onde seria o melhor local para montar minha banquinha de autógrafos. O mordomo me indicou a lavanderia da mansão. Um ótimo lugar, segundo ele, para se vender e autografar livros.

Eu na banca de autógrafos. Foto tirada por mim mesmo
Não demorou a aparecer o primeiro comprador, o próprio Austregésilo, que estava passando por ali com uma faca enfiada em suas costas.
- Opa, Austregésilo. Dando uma voltinha?
- Hrruuu... – disse o Austregésilo.
- É sempre bom pegar um ar, né?
Austregésilo continuava a se arrastar, resmungando e ignorando a minha pergunta.
- Austregésilo! Sou eu, o Fimose, lembra?
- Oorhg... – me respondeu.
- Filho da Bernadete, cara. – insisti.
Ele continuou a não me dar atenção. Logo constatei que Austregésilo havia se tornado tudo o que havíamos prometido nunca nos tornarmos: Um maldito velho arrogante com uma faca enfiada nas costas. Isso, de certo modo, me fez ficar muito puto. Tive vontade de enfiar uma faca nas costas daquele crápula, mas não o fiz, visto que ele já tinha uma faca enfiada nas costas. Maldito, sempre um passo à frente de todos. Deixei que fosse embora, ele e sua lustrosa faca enfiada nas costas.
Sempre querendo ser o centro das atenções.
Não demorou muito para chegar o segundo possível primeiro comprador do meu livro. Era um rapaz grande, com um pandeiro em uma mão, um mp3 player na outra e uma camiseta branca com uma enorme mancha vermelha, parecia estar nervoso, procurando por algo. Sorri e puxei conversa.
- Opa, opa, opa. Chegue mais, meu querido. Qual o seu nome?
- Hã... Como? Meu nome? Pra que? – gaguejou.
- Oras, para eu autografar um livro para você, meu amiguinho.
- Na verdade eu não quero o seu livro.
- Não? – decepcionado perguntei.
- Não, não. Eu preciso de uma camiseta limpa. A minha... Bom, a minha tá suja de... de vinho. – explicou-me o rapaz – Por isso vim aqui na lavanderia.
- Bom, mas camisetas eu não tenho. Somente livros e autógrafos.
Vendo que eu não estava ali para brincadeiras, o rapaz disse que compraria um livro e que eu poderia autografá-lo, mas que para isto acontecer eu teria de trocar de camiseta com ele. Claro que eu aceitei sem pestanejar. Instantes depois eu estava usando a camiseta manchada de vermelho.
- Mas então... Qual seu nome? – perguntei.
- Pra que?
- Pra eu autografar, oras.
- Ah... Ronald Rios.
Peguei a caneta, abri um livro e comecei a autografar. Quando levantei os meus olhos o tal Ronald Rios não estava mais lá. Havia se mandando com a minha camisa limpinha.
Fiquei na banquinha o resto da noite e nenhuma alma viva passou por lá para pegar um autógrafo. Eu já estava começando a suspeitar que uma lavanderia não era um local apropriado para uma noite de autógrafos, até que apareceu um sujeito muito estranho, com uma coxa de galinha na mão. Ele olhou para mim, grudou os olhos na mancha da camiseta que eu usava, fez uma cara de “desvendei o crime” e disse:
- Alto lá, meliante. Sou o Detetive Mesquita.
Sorri, peguei a caneta, abri um livro e comecei a autografar.