quinta-feira, 26 de julho de 2007

Jonél

Meu nome é Jonél. Sou maestro do principal coro dos anjos do Paraíso. Não o bairro de São Paulo, que fique claro. Moro no Éden. No Céu. Na Salvação Final. No oposto da Barra Funda. Essa sim, o bairro de São Paulo.
O nome do coro dos anjos é “Afanásio Jazadji é Quase EU”. A idéia do nome foi do próprio DEUS, que gostava muito dos programas do Afanásio no rádio. Durante um tempo, ELE até deixou uma barba parecida com a do Afanásio, em homenagem. Pelo que ouvi falar, desde 82, ELE está em negociações com o Coisa-Ruim para que o Afanásio, quando morrer, vá para o Paraíso. Ainda não chegaram a um consenso.
De volta ao assunto, devo informar que também sou um anjo. Mas não um anjo-canoro, como os outros que fazem parte do coro. Sou um anjo em uma condição especial, conforme explicarei dentro de (dependendo do seu nível de alfabetização ou velocidade de leitura) alguns instantes.
Antes, é importante dizer que fui enviado de volta à Terra por vários motivos. O primeiro, e também o mais importante, é me formar em música. Ainda estou fazendo o curso. O segundo seria impedir que um bacana chamado Austregésilo fosse morto. Deu zebra.
Antes de chegar a esse ponto, quero falar da minha condição de anjo especial. E de porque vim estudar música e, de quebra, proteger o velho Austre.
Na Terra, meu nome muda de Jonél para Joné, já que aqui deixo de ser anjo. Como tive que vir às pressas, não deu para me gerarem por nove meses e aquela coisa toda.
Deus, em sua infinita sabedoria, me mandou de volta direto para dentro do meu caixão. Colocou uma ferramenta ao meu lado, dentro do caixão, para sair de lá sem muita dificuldade e me matricular na escola. E, se desse tempo, salvar o velho.
Devido a problemas operacionais, não voltei como anjo. Ou como humano. Ou mesmo como um dálmata, coisa que era meu sonho desde criança.
Graças a esse lance de Deus me botar de volta no caixão, acabei me tornando um morto-vivo. Meio angelical, meio diferente, é verdade. Mas ainda assim, um morto-vivo.
Não sou um morto-vivo clássico porque sei discernir o certo do errado, tenho certa agilidade, não ando todo trôpego por aí. Sei ler, escrever e falar mais do que duas frases inteiras. Entretanto, infelizmente, não resisto à tentação de comer cérebro. Adoro miolos.
Sobre as aulas de música, a questão é mais simples.
O CHEFÃO sabe – e sempre soube, já que ELE é quem é – que o coro está muito desafinado. ELE sabe também que a única música que ensaiamos, já há anos, está muito ruim.
E a coisa está ruim por vários motivos. Em parte, porque os próprios anjos nunca ouviram a versão original da música que ensaiamos. Em parte, porque nunca fui maestro.
A música que ensaiamos e ensaiaremos pela eternidade é "Like a Virgin", da Madonna.
Quando eu era vivo, era fã da música. Cheguei a fazer muita bobagem por conta disso. Morri, inclusive, devido a essa minha tara. Agora, nem sou mais tão fã. Gosto mesmo é de um belo prato de miolos com molho de tomate e queijo.
De qualquer forma, vim para a Terra para estudar música, fazer o trabalho de conclusão de curso sobre "Like a Virgin" e voltar para o Céu com bagagem suficiente para realizar um bom trabalho no coro.
Quanto ao Austregésilo, a questão é outra.
Sabendo que eu viria à Terra, a Dona Morte pediu encarecidamente que eu evitasse a morte do tal Austregésilo. Ela queria tirar férias justamente na semana da festa que ele seria morto.
Ela não queria passar o trabalho para alguma outra entidade. Da última vez, a Mãe Natureza, que aceitou o trampo porque estava dura, fez tudo errado. Não trouxe as pessoas certas, não teve coragem de matar quase ninguém e ainda criou uma nova espécie de animal. Hoje, esse animal é conhecido como Equidna.
(Este episódio deixou DEUS fulo de raiva. Invariavelmente, a Equidna é apontada como uma das maiores barbeiragens do TODO PODEROSO, ao lado da criação do Ornitorrinco, da falta de calos nas cordas vocais do Chorão e da formação do J. Quest.)
Assim, prometi à Dona Morte que não deixaria ninguém se aproximar do velho. Ela topou e começou a fazer as malas para Cancun. Não sem antes me dar as instruções de como entrar na festa do Austregésilo.
Ela havia feito um acordo com Dercy Gonçalves, conhecida de longa data tanto da morte como do tal Austregésilo. A Dercy, em troca de mais um tempo na Terra, facilitaria minha entrada na festa. Eu me passaria por um primo distante dela e atenderia pelo nome de Jonercy Gonçalves.
A primeira parte do plano funcionou muito bem. Entrei na festa como Jonercy Gonçalves, primo-neto da desbocada comediante. Tive alguns problemas com curiosos, que, em plena festa, me "arrodiaram" e queriam saber, na verdade, qual era a profissão de Dercy. Se era atriz, comediante, dançarina ou aposentada.
Consegui me livrar de todos eles respondendo que ela era paga para falar palavrão na TV. Todos aceitaram a desculpa e me deixaram em paz. Para, como fiquei sabendo depois, incomodar um suposto sobrinho-primo-neto do Miéle. Eles queriam saber, exatamente, qual era a profissão dele.
Em algum momento, até ouvi o tal parente do Miéle, parece que se chamava Daniell Rezende e estava com um sorvete esquisito o tempo todo em uma das mãos, responder que a profissão do tio-avô beberrão famoso era “ser amigo dos outros”. Me convenceu.
De qualquer forma, eu tinha mais o que fazer. Tinha de proteger Austregésilo.
Assim que me desvencilhei de todos, comecei a rodar a festa atrás do velho. Já o tinha visto por fotos, mas ainda não havia visto pessoalmente. Alguns bons minutos de caça depois, meu estômago começou a roncar.
Eu já estava sem comer há alguns dias e na minha cabeça começou a se formar a imagem de um suculento cérebro coberto com molho de tomate e queijo. Neste mesmo instante, eu vi o velho Austregésilo. Ele passou pela minha frente, meio que apressado.
Foi rápido, mas foi o suficiente para eu ver aquilo que acredito ser o crânio mais bonito da minha curta carreira de morto-vivo-angelical. Era uma cabeça ovalada, com um que de austera, que somente poderia conter um dos cérebros mais suculentos que já vi. Comecei a babar.
Tentei me controlar. Fechei os olhos, mas somente vinha à minha mente a cabeça ovalada. Ajudava a aumentar minha fome o perfume do xampu que exalava da cabeça do velho Austregésilo.
O aroma, impregnado no meu olfato, era um misto de Neutrox com babosa. Para traçar um paralelo, Neutrox com babosa está para o olfato-paladarístico de um morto-vivo como molho barbecue está para o de um humano.
Neste momento, percebi que vivia um paradoxo.
Tinha de proteger Austregésilo. Mas, se chegasse perto dele, poderia eu mesmo não resistir aos meus instintos e matá-lo, para depois abocanhar seu cérebro.
Além disso, se alguém o matasse, quem viria buscá-lo? Dona Morte estava, a essa hora, em Cancun, dando mais do que chuchu na cerca.
Se conseguissem matá-lo, o que aconteceria com a Dercy Gonçalves, comigo, com a Dona Morte e com Austregésilo? Por fim, será que, se o crime fosse cometido, alguém se incomodaria se eu desse uma beliscada em seus miolos?
Com muitas dúvidas – entre elas a profissão de Dercy – disparei para a cozinha. Invadi a despensa atrás daquilo que achei que seria a única coisa que poderia me ajudar fisicamente. Miolos. De pão, no caso.
Eles funcionam como carne de soja para mortos-vivos. E, embora eu não gostasse, iria aplacar minha fome e colocar meus pensamentos no rumo certo.
Entre um naco de miolo de pão e outro, que cuidadosamente besuntei com um pouco de creme rinse que achei pelo caminho, ouvi uma confusão em outro local da casa.
Ao que parecia, Austregésilo estava morto.
Peguei uma colher de pau e corri para lá. Se ninguém se importasse, eu iria pegar um pedaço de cérebro de verdade, para comer mais tarde.

18 comentários:

Anônimo disse...

Hahahahahahahaha!! Que texto mais doido! Pior que quanto mais textos aparecem, menos eu cosnsigo imaginar como vai terminar essa bagunça!

Tô adorando mesmo! Perdi a linha aqui no estágio rindo alto.

P.s.: Ainda acho que a culpa é do mordomo. Apesar do depoimento ser totalmente doido, é fácil de ser comprovado. Só arranjar um cérebro e entregar pra ele. Se o cara comer, é morto-vivo mesmo. Simples!

Anônimo disse...

Hahahahahaha!

(chego a estar sem ar)

Anônimo disse...

Caralha, Buck! Que texto sensacional! Parabéns.

Anônimo disse...

Que beleza, Até o Jonél apareceu aqui, agora só falta aparecer tbém a demonia com quem ele saiu do cemitério pra entrar no curso de música...

Unknown disse...

urgh!!

que texto escabrosooo...
e absolutamente genial !!!!!!!!!

hahahahahahaa
criatividade mil !!!

*Renata Costa* disse...

Hahahahahaha excelente =)

Lord of Waters disse...

Testo buono.

Eu mantenho o meu palpite inicial, apesar de achar essa história toda deveras suspeita.

Vou debater isso com o Príncipe das Trevas no chá das 5. =p

Mymi disse...

Vou anotar seu nome no meu alfarrábio. Muito suspeito!

Anônimo disse...

Se a Dercy estava presente pergunto: e o Cid Moreira? e o SS?
Não chamaram o Galvão pra transmitir o velório?
Continuo achan do que foi o Frotinha fantasiado de freira.

Anônimo disse...

Leandra=^.~=Lia

Aff!

Agora pronto! Viciei!

To adorando essa historia e cada vez mais curiosa pra ver onde isso vai dar...

Bom até agora não vi inguém apontar o NENECO, ele se faz passar por um "sem noção" mas acho q ele é muito esperto, talvez tenha matado o velho pra livrar seu amigo cabelo "o mordomo" (muito suspeito tb, mas talves esteja so fazendo poze e querendo q todos avreditem q ele é o assassino) de mais dor e se libertar desse fardo q o amigo tato odeia.
Mas estou agurdando mais depoimetos e tirar mais conclusões e ver se mudo de opnião. (mudarei com certeza isso tudo ta muito loko srsrsrs)


***Rsrsrsrs, me envolvi e soltei uma risada aki no escrtporio kkk!Sensacional, textos maravilhosos, muito criativos, parabéns!!!

Camila disse...

afe, sem comentarios!!
huahuahauhauahauhauah

e cada vez mais doido isso aqui!!

f. disse...

tou adorando isso aqui, fios.

Anônimo disse...

hahaha

foda demais.

Anônimo disse...

mioooooolos!

sinto dores nos pés esquerdos... isso sempre acontece quando um morto-vivo está por perto.

Anônimo disse...

Ahahahaha
Pô,creme rinse foi demais.
quem escreveu isto é tão véio
qto eu.
ahahaha
adoreiii.

Anônimo disse...

Bom, a verdade é que sou velho.

Mas é verdade também que só escrevi "creme rinse" porque na hora não me vinha à mente, de jeito nenhum, a palavra "condicionador".

Lady Sith disse...

Anjo-morto-vivo, dúvidas sobre a profissão da Dercy, coral celestial cantando "Like a Virgin", miolos com creme rinse... Meu, isso aqui está ficando cada vez mais genialmente absurdo.

E eu ainda desconfio do Cabelo.

Unknown disse...

Por isso que vc é o maior nome da literatura mundial bucha